Rompendo o cordão umbilical

O cordão umbilical é uma espécie de órgão que vai se formando conforme o crescimento do bebê no interior do útero. Ele promove uma ligação inseparável com a mãe, como se ela e seu filho fossem um único ser. Por meio do cordão umbilical o bebê é alimentado e nutrido até o momento em que estará pronto para sair do ventre materno e então ser definitivamente separado de sua progenitora com o rompimento radical desse elo de ligação.

Embora esse rompimento aconteça imediatamente após o nascimento do bebê, por vezes, nós mães, temos dificuldades em assimilar esse fato. Achamos que nossos filhos continuam presos a nós como se fossem um órgão a mais e nossas atitudes serão em muitas ocasiões guiadas por esse sentimento.

Sem a menor sombra de dúvida, nossos bebês necessitam de todo carinho, de todos os abraços, beijos e afagos que possamos oferecer. Essas são ferramentas aliadas nossas, as quais nos permitem desenvolver a auto-estima de nossos filhos, mostrar-lhes que também podem ser afáveis e gentis, porém não podemos nunca usá-las para justificar, ainda que inconscientemente, nossa insegurança em aceitar que o cordão já foi rompido.

Nossos filhos não são parte de nós, são pessoas, indivíduos que possuem genoma único, capazes de raciocinar por si próprios, de reagir de modo ímpar às mais diversas situações e devem ser estimulados a desenvolver seu caráter através daquilo que apreendem do meio em que vivem. Se a todo instante tentarmos transpor as barreiras que são colocadas a frente de nossos filhos, como aprenderão a rompê-las?

A partir do momento em que nasce todo ser humano passa por alguma dificuldade, seja o sofrimento pelo parto, seja a mudança de ambiente, seja a sensação de frio, todas essas novas circunstâncias são de extrema importância para inserir o bebê no contexto em que irá viver. Esse pensamento é válido para todas as etapas da vida de nosso filho. Enquanto o socorremos apressadamente quando acordam no berço, enquanto evitamos que sintam completamente o vento em seu rosto ou deixamos de negar-lhes algo para não chorarem ou se entristecerem mostramos que nós ainda não rompemos o nosso cordão umbilical. Querendo agradá-los fazemos aquilo que eles poderiam e até deveriam fazer, e agimos assim para que não sofram ou se frustrem. Mas onde está escrito que evitar as frustrações na infância é benéfico para o futuro? Não podemos nos esquecer que as dificuldades são inevitáveis e se pouparmos nossos filhos de sofrer agora enquanto podem ser consolados e disciplinados em amor, como reagirão ao receberem um “não” na vida adulta? Pedirão demissão? Desfarão o casamento? Desprezarão um amigo?

Vejo duas formas erradas de procedimento que revelam o não rompimento do cordão umbilical materno: uma delas é essa que me referi acima, em que a mãe resolve todos os problemas de seu filho, seja evitando que ele suba numa cadeira (afinal ele pode cair), evitando que brinque na terra para não se sujar, levantando-o do chão rapidamente após uma queda, etc, isto é, impedindo a criança de ganhar confiança em si mesma, de vencer seus medos e desenvolver sua capacidade criativa para resolver problemas.

Outra forma seria evitar a disciplina, como se a criança não tivesse capacidade de compreender limites e então vai formando seu caráter desconhecendo o padrão de certo e errado. O desejo de evitar o sofrimento de nossos filhos os torna apáticos diante da vida, inertes, desconectados do mundo ao seu redor.

No Salmo 127 vemos que os filhos são comparados a flechas na mão do guerreiro. Pensando a respeito dessa comparação podemos perceber que as flechas, assim como os filhos, não permanecerão para sempre no interior da aljava, senão perderiam completamente sua utilidade. Mas serão usadas em momento oportuno, e não serão colocadas no alvo com as próprias mãos do guerreiro, serão lançadas para que sigam seu caminho. A habilidade do guerreiro está em lançar as flechas mas serão elas que atingirão o alvo.

Romper o cordão umbilical é um exercício que toda mãe deve fazer, repensar o modo como enxerga seu filho, respeitando suas peculiaridades, ajudando a controlar seu temperamento, permitindo que encontre barreiras e as supere. Nossos filhos não serão bebês para sempre, serão homens e mulheres atuando na sociedade. Como tomarão suas próprias decisões se sempre houver quem as tome por eles? Podemos e devemos auxiliar nossos filhos a superar cada etapa de suas vidas mas não podemos permitir que eles sejam passivos nesse processo.

Comentários

Anônimo disse…
É verdade Sú, por mais que nos inquietamos e ficamos na expectativa do desenvolvimento e aprendizado de nossos filhos, temos que praticar o "rompimento do cordão umbilical", seja apenas através um simples levantar sozinho após uma queda ou um inesperado subir degraus, a gente já vê o quanto nossos filhos são capazes de muito mais que esperamos e incentivamos.
Que o nosso Deus nos ajude a sermos mães que sirvam de apoio no crescimento deles ao invés de mães inibidoras.

Um grande beijo com carinho, Aninha
Anônimo disse…
Oi Suenia

Gostei demais deste seu post. Aliás gostei de todos, mas este em particular foi muito edificante para mim. Me fez repensar alguns conceitos. Acho, inclusive, que você deveria escrever um livro! Seria um sucesso!

Bjos, Lena

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